![]() Mães Maravilha Ser mãe de um filho com necessidades especiais pode ser duro, na maioria das vezes. Como sabemos, nem sempre os problemas são logo detetados durante a gravidez, fazendo com que só depois de o bebé já ter nascido, os pais se apercebam de que algo não está bem e procurem ajuda. Por outro lado, alguns desses problemas podem ser originados por complicações no parto, se houver um descuido da parte da equipa médica. A revista “Visão”, numa publicação recente, retrata um pouco do que é ser mãe de uma criança com necessidades educativas e a dificuldade que se sente na adaptação e aceitação desta realidade. O artigo retrata o medo que os pais sentem antes do parto. Medo, principalmente, que a criança seja diferente, que não tenha os devidos cuidados e direitos e que não seja respeitada. Também que, em espaços como a escola, não seja integrada com as outras crianças. No artigo fala-se também da dificuldade que existe em obter um diagnóstico e das rotinas de ser pai/mãe de uma criança diferente, rotinas atípicas, que podem ser muito difíceis e trazer diversos obstáculos no dia a dia. Apesar de todas as dificuldades e limitações, o assunto é muito pouco falado e pouco se mostra desta realidade nos media, fazendo com que esses casos sejam “esquecidos” por muita gente. Ser mãe de uma criança com deficiência é como fazer parte de um clube a que ninguém quer pertencer" Patrícia Lamúrias Sensibilizados com esta temática que atinge muitos pais e mães, decidimos fazer uma reportagem sobre uma realidade que nos toca e sensibiliza. Assim decidimos investigar o tema e entrevistar algumas mães de colegas nossos para que nos dessem a sua visão e experiência pessoais sobre esta realidade. Como é ter um filho com necessidades educativas?Sónia Cristina: Ter um filho com necessidades educativas especiais, especificamente com dificuldades de aprendizagem, exige um acompanhamento educacional diferenciado. Como mãe, tenho trabalhado em conjunto com a escola para desenvolver um Plano Educacional Individual (PEI) que atenda às necessidades específicas do meu filho. Adaptei as atividades em casa para que ele possa desenvolver as suas capacidades e alcançar as metas estabelecidas. O meu papel é fornecer o suporte necessário para que ele possa aprender, crescer e ser feliz, que não seja visto pelas suas limitações, mas pela criança que ele é. Quero que ele se sinta parte de um grupo, que interaja com seus colegas e viva uma infância plena, como qualquer outra criança. Neide Lousa : Ter um filho com necessidades educativas, como "paralisia cerebral que afeta a área motora", é ter consciência do papel que tenho de enfrentar e adaptar-me a uma nova realidade, com vivências, dificuldades, limitações e desafios que a deficiência do meu filho acarreta. Trata-se de uma série de responsabilidades que exigem muitas vezes abdicar dos meus desejos e aspirações em todos os âmbitos da vida pessoal, social e profissional, a fim de contribuir da melhor forma possível. Procuro forças e coragem, mesmo sem saber onde, para promover o desenvolvimento saudável do meu filho, para que ele tenha muitas conquistas, seja feliz e se sinta amado pela família. Como é o dia a dia de uma mãe de um menino com necessidades educativas? Qual a maior dificuldade? Sónia Cristina: O dia a dia de uma mãe de uma criança com necessidades educativas é mais desafiador. Além da escola, o meu filho também faz terapias fora do ambiente escolar, como terapia ocupacional, hidroterapia e hipoterapia. Isso exige que eu ajuste o meu horário profissional de acordo com o dele, o que muitas vezes se torna complicado. A falta de apoio adequado fora do horário escolar também agrava a situação, já que existem poucos lugares capazes de integrar crianças com necessidades educativas especiais de forma inclusiva, respeitando as suas características individuais. Neide Lousa : Trabalho a tempo parcial, uma decisão que tomei para poder priorizar o meu filho e lidar melhor com as minhas próprias emoções e preocupações. O meu dia a dia começa cedo e termina tarde; nem todos os dias são previsíveis. Levanto-me às 6h15 e preciso estar pronta até às 7h30 para o acordar às 7h40. Faço a sua higiene pessoal, visto-o, dou-lhe o pequeno-almoço, a medicação e depois saímos para esperar o transporte escolar. Enquanto aguardamos, preciso de o sentar no início das escadas, para que ele possa descer degrau a degrau, sentado. Normalmente, às 8h30, ele vai para a escola, onde fica até às 15h15 e, nesse período, aproveito para trabalhar. Depois de o deixar, subo a casa para ajeitar rapidamente algumas coisas, pego nos meus pertences e vou para o trabalho. Saio às 15h00 e, assim, consigo chegar a tempo de o receber. Por vezes ainda tenho assuntos para resolver, como fazer compras, ir a consultas ou outras tarefas, mas a minha tia (um dos meus apoios, sendo o outro o meu filho mais velho) ajuda-me, esperando para o receber. Quando chego a casa, preparo o nosso lanche. Enquanto ele faz as terapias, aproveito para descansar um pouco. Ao terminar, já é final do dia e começo a preparar o jantar. Jantamos, conversamos, preparo-o para dormir, arrumo as coisas, deitamo-nos, continuamos a conversa, rimos, brincamos e, às vezes, ainda lhe dou um ralhete para que adormeça. As noites terminam entre as 22h30 e a meia-noite. Assim é o nosso dia a dia: por vezes muito cansativo, outras nem tanto, mas sempre com um sorriso e sentindo-me amada. Ter um filho com necessidades educativas também traz algo positivo. O que acrescentou à sua vida? Sónia Cristina: Na minha experiência pessoal, ter um filho com necessidades educativas especiais fez de mim uma pessoa mais resiliente, perseverante, empática e tolerante, além de me ensinar a respeitar ainda mais as diferenças. Aprendi a perceber as qualidades que muitas vezes passam despercebidas pela maioria das pessoas, e desenvolvi uma maior capacidade de valorizar os bons momentos, os progressos, desafios e conquistas do meu filho. Neide Lousa : Acrescentou à minha vida a capacidade de valorizar melhor os momentos vividos e a sabedoria de apreciar cada pequena conquista. Qualquer progresso é uma vitória, é uma alegria. Tornei-me uma pessoa muito mais forte do que era e ganhei uma nova visão positiva da vida. As dificuldades que enfrento são variadas, mesmo contando com o apoio da minha tia e do meu filho mais velho. Ter de desempenhar o papel de mãe e pai ao mesmo tempo é um grande desafio, e muitas vezes não sei como me desdobrar. Um dos obstáculos principais é o acesso à nossa casa: subir e descer escadas com a cadeira de rodas torna-se especialmente difícil, já que o prédio não possui elevador. Além disso, existem barreiras arquitetónicas em vários pontos da cidade, limitando a circulação e o acesso a alguns locais e serviços. Lido também com a pressão emocional e as suas consequências, além da limitação de recursos financeiros para cobrir as despesas regulares decorrentes das necessidades. Agradeço pela compreensão e pela oportunidade de partilhar a minha experiência. Obrigado, Mães-maravilha! Também as professoras Liliana Bota e Maria João Minga participaram nesta reportagem, partilhando o seu testemunho, sobre o quão enriquecedor é trabalhar com crianças com necessidades especiais. Obrigado, professoras! |